A capital de Angola devia ser transferida para outra província, por exemplo o Huambo ou o Bié, defendeu hoje em declarações à Lusa a escritora angolana Maria Alexandra Dáskalos.
"Sou defensora disso. O que aconteceu nestes mais de 30 anos foi que realmente houve uma altura muito megalómana, muito macrocéfala de Luanda em relação ao resto do país. E seria altamente positivo deslocar a capital, porque Luanda se tornou numa cidade de rotina insuportável. É um desastre urbanístico", disse.
Nascida no Huambo, Maria Alexandra é sobrinha do nacionalista angolano Sócrates Dáskalos, fundador em 1961 da Frente de Unidade Angolana (FUA), e lançou quinta-feira em Lisboa um livro em que publica a tese de mestrado em História Contemporânea, com o título "A Política de Norton de Matos para Angola - 1912/1915", da responsabilidade das Edições MinervaCoimbra.
Maria Alexandra Dáskalos justificou a escolha do tema pelo que considera ter sido o "papel fundamental de Norton de Matos no lançar das bases da Angola moderna" durante o primeiro período de governação, entre 1912 e 1915.
"A reforma administrativa e o redesenhar do mapa de Angola, com as 'campanhas de pacificação', a rede de estradas e a penetração das três linhas férreas, a fundação da cidade do Huambo no planalto central e o objectivo de fazer desta área uma região estratégica no projecto da revolução agrícola, são factores que alteram e definem a Angola moderna", defendeu.
A mudança da capital de Angola permitiria ainda "rentabilizar uma zona como o planalto central e também dar ao povo Umbundu - e isto não é defender etnias -, uma dignidade que merecem", destacou.
"O povo Umbundu está em todo o lado, mas aquela zona merecia a importância que perdeu, porque o Huambo foi das cidades mais modernas em termos de investigação e economia no tempo colonial. Tínhamos ali a fina-flor dos agrónomos e dos veterinários de toda a África", acrescentou.
"Acho que se devia retomar a ideia do Huambo, como Norton de Matos a concebeu e está aqui neste livro como ele a concebeu, e dar importância não só à região, mas também ao povo do planalto central", frisou.
"Um vulto da grandeza de Norton de Matos na I República foi esquecido pelo Estado Novo, por razões que nos parecem óbvias. Porém, o facto de ele ter sido um colonialista provido de uma visão imperial correspondente à sua época levou também a que a revolução marcada pelo pós-25 de Abril e pela independência das colónias de África tenha relegado para um longo silêncio a sua obra em Angola", lê-se no livro de Maria Alexandra Dáskalos.
A investigadora pretende demonstrar com este livro que "a Angola da modernidade nasceu com o projecto imperial de Norton de Matos neste primeiro período de governação e que muitas das suas ideias inovadoras apenas forma concretizadas mais tarde, quando o Estado Novo, isolado internacionalmente, as recupera".
José Maria Mendes Ribeiro Norton de Matos, nascido em Ponte de Lima, em 23 de Março de 1867, iniciou na Índia a carreira na administração colonial, tendo depois viajado por Macau e pela China em missão diplomática.
O regresso a Portugal coincidiu com a proclamação da República e em 1912 assumiu o Governo-geral de Angola, cargo que exerceu até 1915, quando foi demitido em consequência da nova situação política que se vivia em Portugal durante a Primeira Guerra Mundial.
Entre 1921 e 1924 voltou a exercer o cargo de Governador-geral de Angola, tendo posteriormente sido nomeado embaixador de Portugal em Londres, de que foi afastado aquando da instauração da Ditadura Militar, que antecedeu o Estado Novo.
Eleito em 1929 grão-mestre da maçonaria portuguesa, participou nas eleições presidenciais de 1949, desafiando o regime de António Salazar, mas devido à falta de liberdade no acto eleitoral, e prevendo fraudes eleitorais, acabou por desistir depois de participar em comícios e outras manifestações de massas.
NL